3 de fev. de 2009



Deito na cama e pego o livro para ler. Ao lado ele dorme, o corpo imóvel e suado pelo calor do verão. Olho devagar para esse homem e penso nos dias por vir, construo nossa casa, nossos filhos, nossas noites e dias, nossos invernos. Cometo esse equívoco natural da imaginação – ou, me rendo a meus desejos, os mais triviais e tangíveis.

Toco sua pele branca e perco o tempo a contar suas pintinhas, a fazer redemoinhos com dedos em seu cabelos pretos e brancos, a olhar bem de perto como cada pêlo de sua barba nasce para um lado e para outro.

Levanto para buscar um copo de água gelada e atravesso a casa, olho para o lado e as duas portas fechadas me lembram delas, as meninas que não estão em casa, eu não sei onde estão agora. E faz tempo que não sei. Desde que enveredei pelo corpo dele o meu se destacou como um decalque dessa casa.

É como se eu ouvisse as coisas de longe, de muito longe. Um barulho de quintal, de música, risos, conversas, passos corridos. Vindos dos quartos, trocados pelos quartos. Deste aqui, não há o que dizer. Não posso dizer. Não sei dizer. Preciso estar inteira e completa nesta cama, deste jeito quase equivocado que sei ser.

Mas precisa ser assim, de momento. Como me disse um porteiro quando perguntei se havia apartamentos para alugar. “De momento, está tudo ocupado”. De momento, estou. Talvez me machuque esses ruídos vizinhos, parecem muito divertidos. Talvez eu as machuque com os meus, parecem muito íntimos.

Imensamente, meu corpo deseja a harmonia dos ruídos. Talvez, o silêncio.



para Maria

6 comentários:

Unknown disse...

Harmonia dos ruidos... Mais facil silencio... continuo gostando de tua maneira de escrever. Saudades.. a gente se viu tao pouco...
Beijos
Jotaeme

Anônimo disse...

Muito bonito!
Beijos

maria lutterbach disse...

bonito, flora.
beijo

Dorothy disse...

Porque o amor grita no silêncio dos corpos...
E os planos futuros, presente!

Anônimo disse...

nuvem... de momento, te leio.

milena disse...

você escreve imagem, nos faz imaginar o frame que se vive. que bom te ler, paula!