23 de ago. de 2008

paisagem #02



deste lugar eu escrevia uma carta de amor. carta que nunca chegou. deste lugar eu olhava a tempestade, o rio, o barco só. sentia saudade de casa. sentia-me inteira, porém. desejava voltar um dia, e pensava que todas as coisas seriam outras com a volta. daqui de longe, agora, olho as imagens de lá como se não restasse nada. são imagens-memória, perdidas, monumentos de uma passagem breve como o tempo dos homens. monumento de uma carta que nunca chegou. monumento de uma tempestade próxima, que talvez não tenha jamais vindo. e agora eu caminho pelas ruas daqui, desenhando mapas com os pés, sobre o chão antigo dessa cidade. é quase hora de partir e não há nenhum registro de imagem daqui. ainda não foi hora. o primeiro registro dá-se no tempo das coisas, e é preciso olhar atentamente para que uma fotografia não tome o lugar do mundo. não quero um monumento-imagem desta cidade, quero somente senti-la por baixo dos meus pés. e quando eu for embora para não voltar, então poderei fotografar. por enquanto prefiro não tornar registro o que precisa de um tanto mais de vida. tenho um mapa, tenho uma data para partir. a paisagem se constitui de pequenos traços de afeto. sinto saudade daquele barco. e dos olhos que olhavam, calmos, a passagem do tempo.

Um comentário:

Anônimo disse...

Delicada impressão...bonito o que foi escrito.