18 de ago. de 2008

eu guardo esse retrato em uma gaveta perfumada


paula

era uma vez uma mulher que adorava mudar seu nome e seu rosto. de um dia para o outro, seus maços de cigarro começaram a durar mais tempo. ela gostava dos lábios vermelhos durante a noite. de dia, cabelos puxados para trás, era uma menina. gostava de fotografar as coisas a toa, sua avó nos cantos da casa, o sofá vazio, os quadros na parede. ela sabia olhar as coisas paradas como quem visse, ali, tudo acontecer: o envelhecimento era a fotografia viva daquela menina do dia. à noite saía pelas ruas com as roupas encontradas no armário da sua avó. as rendas formavam o corpo bonito por debaixo da roupa, as meias e as pernas, os gestos longos e femininos, as palavras ditas em voz alta, saindo vermelhas da boca, e as mãos aflitas da mulher que deseja pertencer a alguma coisa. a alguém. essa mulher que deseja o amor, enquanto espera, em silêncio, a imagem por vir. ela não sabe que anda pelas ruas com a leveza das mulheres antigas, as mulheres que teciam longos tapetes à espera de alguém. ela tem um ar de como quem entende que seu corpo é um campo de guerra, um corpo vivo. suas mãos, grandes, passeiam delicadas pelos outros corpos. ainda posso vê-la chegar e ocupar todo o espaço com as palavras altas, os lábios vermelhos, posso vê-la pedir uma taça de vinho e levá-lo à boca, ali, onde as cores das paixões se misturam em meio à sua saliva quente.

carolina junqueira

3 comentários:

Anônimo disse...

Eu não sei se já te disse alguma vez... mas seus textos me pertencem. De alguma forma. Vc fala desta menina e eu vou me recordadndo dela neste tempo de menina. Neste tempo tão curto tão intenso de labios vermelhos roupas de vó e fotografias de canto. Vc diz do momento da fotografia e do perigo dela tomar o lugar do mundo... vc diz do por vir e do campo de luta o campo de guerra do corpo... poucas pessoas ainda entendem este lugar... brincam por aí com o corpo, o que tb não tem problema algum... mas este corpo assim... cheio de brincadeiras não me posuem tanto. Um grande abraço.

p.s - agora que vi que o texto é de Carolina. penssei ser de nuven. rsrs mas vai assim mesmo.

Cris

Anônimo disse...

*possuem.. ah.
cris

Anônimo disse...

pensei..ai ando trocando tudo.